Promotor
Câmara Municipal de Vila do Conde
Breve Introdução
Contextualização Artística
Génese do projeto: intuição, necessidade e desejo
A experiência de ser mulher nos dias que correm é marcada por uma acumulação de papeis típicos, transformações corporais, relações e processos pessoais que se fundem o longo da vida. O pensamento feminista e os estudos de género, têm reconhecido que o corpo da mulher é simultaneamente um território político, afetivo e biográfico. Neste
sentido, questões como o envelhecimento, a perda de capacidades físicas, a memória, o luto e o diálogo entre cuidar e ser cuidada assumem um papel fundamental na construção e investigação deste projeto. As questões e os resultados passam hoje pelo filtro de uma experiência pessoal e também mental e emocional que reconhece e acentua
o lugar de uma artista em transformação. Uma reflexão sobre estas camadas a partir do meu corpo e da minha história e do testemunho de outras mulheres que, em conversas íntimas, partilharam fragmentos dos seus caminhos.
A origem deste projeto encontra-se na junção de percursos artísticos, pessoais e académicos que se cruzaram ao longo do mestrado. Durante este caminho, fui desafiada a
olhar para o papel da mulher em diferentes contextos: sociais, simbólicos e históricos. O meu objeto de pesquisa para este mestrado, que nunca mudou mas se adaptou, partiu da tensão entre as imagens da mulher como santa e como satã - dualidades construídas culturalmente e que se mantêm na forma como o corpo e o feminino são regulados e
julgados, isto porque fui percebendo que o meu corpo já não era o mesmo de há 20 anos.
Paralelamente, trabalhei ao lado de uma colega, Priscila Clemente, cuja investigação se debruçava sobre a memória e o envelhecimento, principalmente na vivência de mulheres idosas. A partilha de ideias, reflexões e leituras entre nós, evidenciou, de uma forma muito clara, que os nossos temas não se comunicavam apenas, mas eles se fundiam, se complementavam. Foi nesse cruzamento que encontramos a base deste projeto: a mulher como corpo que envelhece, se transforma, como ser que guarda e transmite memória e como figura que cuida mas que também precisa, e com direito, de ser cuidada.
Assim nasceu um espetáculo onde dois objetos de estudo criativos, que à primeira vista, podem parecer diferentes, se mostraram completamente relacionados: a dualidade entre santa e satã, e a experiência do envelhecimento. A fusão destas duas ideias estabeleceu o pilar de uma encenação que circula entre o documental e o político-poético, com o propósito de explorar os delírios de uma existência enfraquecida e a luta por manter a memória como forma de resistência.
A figura da santa e de satã, mais do que modelos religiosos, foram metáforas dramatúrgicas que serviram para encenar a complexidade particular de um corpo a envelhecer, e cujo trajeto é determinado por escolhas, arrependimentos, fantasias, afetos, traumas, rupturas e as lutas de uma vida inteira.
Neste contexto, o espetáculo assumiu características documentais ao introduzir depoimentos reais, imagens de arquivo, textos autobiográficos e materiais que mostram a
passagem do tempo, criando uma sobreposição estética. A tentativa de não esquecer surge como um gesto poético de identidade, onde o delírio se confunde com a verdade, e onde o corpo em cena representa, ao mesmo tempo, a santa e a satã de si mesma.
O espetáculo, deste modo, oferece uma poética da memória entre lucidez e delírio, entre o sagrado e o profano, entre o que se lembra e o que se perde, entre o que cuida e é cuidado.
Esta noção de cuidar e ser cuidada surge como eixo transversal na proposta, trabalhando tanto na dimensão do corpo em transformação (envelhecer) quanto na dualidade simbólica entre santa e satã. O cuidar assumiu várias camadas: cuidar do corpo que já não responde da mesma maneira, cuidar das palavras perdidas, cuidar da memória, cuidar das histórias que já ninguém quer ouvir. A figura da santa pode ser vista como a que cuida, a que escuta, a que carrega. Já satã, associada à resistência, representa o desejo de a mulher não se deixar domesticar pela expectativa social.
Ao fundir estas ideias - santa, satã, cuidar, ser cuidada, delírio, memória - este espetáculo constrói um corpo politico-poético que se oferece ao público não como uma figura modelo, mas como propósito de conflito, de ruptura e reinvenção. São várias vidas contidas em 50 minutos de espetáculo.
Sinopse
Sa(n)tã - Uma vida em delírio ou a tentativa de não esquecer será a cerimónia “sagrada” da convenção teatral e acontecerá como uma espécie de jogo artesanal, como uma brincadeira. Uma reflexão a vidas de mulheres, revelando as marcas do tempo, as cicatrizes da existência e a beleza na transformação. A trama desvenda histórias reais, onde essas mulheres enfrentam o dualismo entre sagrado e profano, doce e amargo, luz e escuridão, enquanto navegam por memórias, alegrias, solidões e os impactos emocionais que as acompanham. A teatralidade servirá de “substituto laico do acto religioso”.
Espectáculo desenvolvido a partir do projecto final de Mestrado de Artes Cénicas - Criação Teatral da ESMAE. Orientadoras Claire Binyon e Inês Vicent
Ficha Artística
Criação e Interpretação Neusa Fangueiro e Priscila Clemente
Música e sonoplastia Grasiela Müller e Priscila Clemente
Cenografia Filipe Silva e Neusa Fangueiro
Figurinos Filipa Carolina
Desenho de Luz Rui Leitão
Direcção de produção Rui Leitão
Costureira Mónica Melo
Produção Fértil Cultural
Co-produção Teatro Narciso Ferreira/ Casa das Artes de Famalicão
Notas Suplementares
O Cartão Vila Jovem é o novo cartão jovem de Vila do Conde e garante descontos a nível europeu, nacional e local, constituindo-se ainda como um instrumento de apoio ao comércio local.
É necessário a apresentação do cartão na compra do bilhete e na entrada da sala
- 50% de desconto na aquisição de bilhetes para espetáculos culturais promovidos pela Câmara Municipal de Vila do Conde.
Preços